domingo, 21 de junho de 2009

o ser alado

O senhor sabia que há algum tempo conheci um ser alado? Não sei lhe dizer se era um anjo ou coisa que valha. A mim parecia. O senhor por certo irá achar engraçado, eu, um quase cego, dizer-lhe que viu algo. Certo é que vi um vulto, pouco mais do que uma sombra, que se achegou a mim, e senti uma calmaria que há muito não sentia. O senhor acha estranho? Sabe o senhor que não enxergo bem, já o disse. E é duro assim viver, na incerteza do que é certo ou engano. Mas rogo-lhe que me acredite. Por certo que vi um anjo.

Sim, era um anjo, agora estou certo disto. Não sei se era um anjo bom ou um desses que lhe afaga, mas ri nocivamente quando seu rosto não está na direção do dele. O que ocorreu é que ele tinha um carisma, um algo inexplicável que me prendeu a atenção. E me fez bem por um tempo que não sei precisar. O senhor entende? Mas aos poucos o espectro foi se tornando distante quase como algo que eu não pudera tocar. E me senti meio ausente do bem que ele me trazia.

O senhor sabe da minha história. Nem sempre fui assim, quase não enxergando. Já tive olhos brilhantes e bem abertos, de um preto quase da noite. Mas a vida assim quis que eu me cegasse , aos poucos, quase que não querendo ver. E de uma madrugada pra outra as cores foram se perdendo diante de mim, foram os vultos o que me restaram. E deste então tenho dificuldade pra ver, quiçá medo. Porém, o anjo me fez querer ver de novo, com seu jeito duro de me fitar (acredito eu que me fitava).

Isso já faz um tempo, o senhor há de convir. Este ser alado às vezes me espreita, outras me contempla e não raro é indiferente a mim. O senhor não pense que já não tentei tocá-lo. Mas ele é arguto, esquiva-se com facilidade e quando tento, tropeço em algo que meu tato não percebera. Houve um tempo em que desisti de tê-lo ao meu lado, apesar de a figura dele me observar, ao longe - ou seria eu que procurava pela figura dele? - e resolvi me manter na minha calada cegueira. No entanto, toda vez que eu percebia seu vulto voltado pra mim, reacendia-me de esperança.

O senhor deve estar me julgando louco ou algo parecido. Não me importo com tanto. Apenas me importa a presença do anjo, que por ora escasseia. O senhor vai dizer que não existe anjo, que decerto é uma imagem que criei. Acontece que tenho certeza que o tive, por um instante que fosse. E creio que a luz brilhará nos meus olhos de novo, quando eu puder o tocar.

E que seja um anjo torto ou um anjo feérico, ainda gostaria de tê-lo por perto uma vez mais, a mirar meus olhos cegos, quase esquecidos na escuridão. E se o anjo não quiser mais me visitar - talvez nunca o quisesse - saiba o senhor que não esmorecerei. Apenas ficarei um pouco mais cego.

3 comentários:

Anônimo disse...

'Quem só acredita no visível tem um mundo muito pequeno.'

Bacana pacas esse texto!

Beijo LiberTay

Suellen Rubira disse...

Bah que textinho fraco! Parece até uma guriazinha com esses "mimimi"! :D

tá, tu sabe que eu não penso nada disso! só gosto de implicar contigo!

tri lecaaaauuuu!

beijunda.

Paulo Olmedo disse...

Tay
Valeu pelo elogio. Bacana teres gostado.

Freak
Chata! huahuauhauha
Valeu por ter lido, mesmo assim! ;)